A LACRIMOSA
Do aquário dourado de bolhas, que iam desaparecendo com o calor, divagou por uma quantidade de minutos que não preocupou-se em calcular. Naqueles dias, pensou em diversas formas de afogamento. Queria morrer como um aborto em alguma placenta da Terra. Todavia, para satisfazer este desejo, precisaria caber no reservatório como um homúnculo. Homúnculo?! Já o era desde o primeiro minuto em que não tivera coragem de deixar que os primeiros goles de cerveja lhe invadissem com violência a garganta, como os machos fazem. De que lhe serviria o falso moralismo da indecisão? Já havia morrido e ressuscitado uma dezena de vezes com o mesmo sentimento de mar revolto. Os homens sorriam e meneavam as cabeças diante da situação hilária de um sujeito com o olhar perdido no espelho d’água do primeiro copo. Alguns lhe deram tapas nas costas e conselhos consternados que não ouviu. Invisível aos olhos de todos, a mulher, sentada na cadeira vazia à sua frente, fitava-lhe com frios olhos...